Distração, impulsividade, dificuldade de se organizar, de terminar tarefas simples, de acompanhar uma conversa até o fim… Todo mundo tem dias assim. Mas para algumas pessoas, esses desafios são diários, intensos e afetam a vida escolar, profissional e social. Nessas horas, o que parece só desatenção pode ser o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade, o conhecido TDAH.
O TDAH não é uma fase, não é falta de vontade ou uma questão de criança malcriada. É um transtorno neurobiológico que acompanha a pessoa desde a infância e, muitas vezes, continua na vida adulta. Mas afinal, quem recebe esse diagnóstico precisa, obrigatoriamente, tomar medicação? Ou existem outras formas de tratamento?
O psiquiatra infantil Dr. Bruno, que também acompanha adolescentes e adultos com TDAH, explica que a medicação pode ser uma aliada importante — mas não é o único caminho. “Cada caso é único. Antes de pensar em remédio, é essencial entender como o transtorno está impactando a vida da pessoa e o que ela está precisando naquele momento.”
Entendendo o TDAH
O TDAH se manifesta por meio de sintomas relacionados à desatenção, impulsividade e hiperatividade. Algumas pessoas apresentam mais dificuldade em se concentrar, outras são muito agitadas fisicamente, e há quem tenha uma combinação dos dois tipos.
Na prática, isso pode se traduzir em uma criança que não para sentada, interrompe os colegas, esquece materiais da escola ou tem dificuldade para acompanhar a aula. Ou ainda em um adulto que pula de tarefa em tarefa, se atrasa com freqüência e vive com a sensação de que está “sempre correndo atrás”.
A medicação é indicada para todos os casos?
A resposta é: nem sempre. A decisão de usar ou não medicação depende de uma série de fatores. Dr. Bruno destaca que existem três questões principais que ajudam a nortear essa escolha:
1. Gravidade dos sintomas
Se os sintomas estão interferindo de forma significativa no aprendizado, nas relações ou na autoestima da pessoa, o uso da medicação pode ser uma forma eficaz de aliviar esse sofrimento e permitir que ela se desenvolva com mais leveza.
2. Idade e fase da vida
Em algumas fases, como a infância e a adolescência, os sintomas podem se intensificar, especialmente com o aumento das exigências escolares. Já em adultos, a decisão pode envolver questões profissionais, relações interpessoais e qualidade de vida.
3. Disponibilidade para outras abordagens
Terapias comportamentais, acompanhamento psicopedagógico, organização da rotina e orientação familiar também são formas de tratar o TDAH. Em alguns casos, essas abordagens já são suficientes para controlar os sintomas.
Quais são os tipos de medicação usados no TDAH?
Os medicamentos mais usados são os psicoestimulantes, como o metilfenidato e a lisdexanfetamina. Eles atuam em regiões do cérebro ligadas à atenção, ao planejamento e ao controle da impulsividade.
Como esses medicamentos funcionam?
Basicamente, eles ajudam o cérebro a usar melhor os neurotransmissores dopamina e noradrenalina, que estão envolvidos nos processos de atenção e foco. O efeito costuma ser rápido, com melhora visível da concentração, da organização e da capacidade de finalizar tarefas.
Mas, como todo medicamento, eles também podem trazer efeitos colaterais, como diminuição do apetite, dor de cabeça, insônia ou irritabilidade. Por isso, o acompanhamento médico constante é fundamental para ajustar a dose e avaliar se o benefício está compensando os possíveis desconfortos.
Quando a medicação não é o melhor caminho
Existem situações em que o tratamento pode ser feito apenas com apoio psicossocial. Por exemplo:
- Crianças pequenas, com sintomas leves e famílias dispostas a investir em mudanças de rotina e acompanhamento terapêutico;
- Adolescentes ou adultos que encontraram estratégias eficientes para lidar com suas dificuldades e não se sentem prejudicados no dia a dia;
- Casos em que os efeitos colaterais da medicação são mais intensos do que os benefícios esperados.
Dr. Bruno ressalta que o mais importante é olhar para a pessoa como um todo, e não apenas para o diagnóstico. “Tem gente que tem TDAH e se organiza muito bem com agenda, aplicativos, apoio da família. Tem outros que realmente precisam da medicação para conseguir estudar, trabalhar, manter relações. Cada história é diferente.”
E os riscos da falta de tratamento?
Quando o TDAH não é tratado, os impactos podem ser profundos. Problemas escolares, baixa autoestima, relações sociais difíceis, ansiedade, frustração constante e, em alguns casos, desenvolvimento de outros transtornos, como depressão e abuso de substâncias.
Por isso, o tratamento não deve ser adiado. Mesmo que a medicação não seja necessária naquele momento, é importante que a pessoa tenha um plano de cuidado e um profissional de referência para acompanhar sua trajetória.
Caminhos possíveis, escolhas conscientes
A decisão de usar ou não medicação para o TDAH é pessoal, compartilhada entre paciente, família e profissional de saúde. O que serve para uma pessoa pode não funcionar para outra, e tudo bem.
Dr. Bruno costuma dizer que o tratamento do TDAH é como montar um quebra-cabeça: às vezes, a medicação é uma peça essencial. Outras vezes, o que faz mais diferença é a organização da rotina, a compreensão dos professores ou um ambiente mais acolhedor.
O importante é que a escolha seja feita com informação, escuta e sem pressa. Porque tratar o TDAH não é apenas reduzir sintomas, mas sim ajudar a pessoa a viver com mais autonomia, bem-estar e confiança em si mesma.